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Muito tempo passara desde o primeiro jogo do Brasil, uma derrota a 20 de setembro de 1914, em Buenos Aires, às mãos da vizinha e rival Argentina. Desde então, o Brasil ganhara por duas vezes a Copa América em 1919 e 1922 e marcara presença tanto no Mundial do Uruguai (1930), como no Mundial de Itália (1934), ficando-se logo pela primeira fase em ambos os torneios.
No Mundial francês, o Brasil era o único representante da América do Sul, dados os boicotes argentinos e uruguaios, em protesto com a FIFA por esta não ter cumprido com a rotação entre continentes na realização do torneio.
As expectativas brasileiras eram grandes. Ademar Pimenta formara um grupo que finalmente merecia a alcunha de «A Seleção». Na frente brilhava o grande Leônidas da Silva, o «Diamante Negro», apelido que ganhou no Mundial por culpa do jornalista francês Raymond Thourmagem, da revista Paris Match, que, maravilhado pela habilidade do brasileiro, o comparou à mais brilhante das pedras.
Na frente brilhavam também Perácio e Romeu, enquanto, na zona mais recuada, Zezé Procópio e o capitão Martim Silveira tanto paravam o jogo adversário, como municiavam o ataque brasileiro. Lá atrás, o campo - e a bola - eram domínios de Domingos da Guia, o «Mestre Divino», aquele que os brasileiros ainda hoje reverenciam como o melhor central de todos os tempos.
Domingos era o primeiro de uma escola de zagueiros que gostava de sair com a bola controlada, driblando adversários e fazendo «tabelinhas» com os colegas. O seu génio residia na sua capacidade de antecipar os lances, ao ponto de Gilberto Freyre o comparar na grandeza a Machado de Assis e José Lins do Rego dizer dele que era um «intelectual de calção, meias e chuteiras».
Ademar Pinta preparou a equipa em detalhe, convocando e treinando dois «onzes» distintos: um mais técnico e outro mais físico, preparando-se assim para adversários distintos. Um desses adversários que exigia medidas especiais era a Polónia, semi-finalista dos Jogos Olímpicos de 1936 e que o Brasil encontrou nos oitavos de final, em Estrasburgo, a 5 de junho de 1938.
Os golos cantados
O desporto - e o futebol em particular - começavam a ganhar espaço na Europa, mas também no Brasil. Viviam-se os anos dourados da rádio, e os brasileiros reuniam-se regularmente em volta da telefonia para ouvir teatro, poesia e música ao vivo. O futebol tinha o seu primeiro grande momento com o jogo contra os poloneses - como no Brasil são conhecidos os polacos - a receber a honra de ser a primeira partida de um Mundial de futebol a ser transmitida pelas ondas do éter para os quatro cantos do Brasil.
Os auriverdes - os brasileiros ainda não jogavam de camisola amarela e calções azuis nem eram conhecidos por 'canarinhos' - não defraudaram as esperanças dos compatriotas naquele campo enlameado do La Meinau, em Estrasburgo.
Os azuis - essa era a cor do Brasil nessa tarde histórica - abriram o placard aos 18 minutos com um golo de Leônidas, mas, pouco depois, Batatais derrubou Ernest Wilimowski e o árbitro sueco Eklind - o mesmo da final de 1934 - marcou grande penalidade, a qual Fryedryk Szerfke não perdoou.
O Brasil não acusou o golo e Romeu e Perácio apontaram dois golos que deram uma vantagem confortável ao intervalo (3x1).
Reação polaca e a chuva de golos
A chuva começou a cair impiedosamente no segundo tempo e os europeus pareciam mais preparados para jogar naquele terreno. Wilimowski começou a abrir o livro e a deixar uma marca na história do Mundial, apontando dois golos até aos 59 minutos.
O Brasil reagiu e Perácio voltou a colocar os sul-americanos na frente aos 71 minutos. A festa já ecoava na bancada quando Wilimowski apontou um hattrick no último minuto e obrigou a um prolongamento.
Leônidas resolve
Pimenta tentou acalmar a equipa, levantando o espírito dos seus jogadores abatidos pelo golo tardio dos polacos. Quem tinha Leônidas podia acreditar e o avançado carioca assim demonstrou que era verdade. Pediu a bola e não se escondeu do jogo. Três minutos depois do reatamento e já a estrela do Flamengo fazia balançar as redes polacas. Pouco depois, perdeu uma bota na lama, mas não falhou o remate e fez o 6x4, apontando um hat-trick histórico.
Wilimowski não quis ficar atrás e ainda marcou um golo a dois minutos do fim, tornando os instantes finais absolutamente eléctricos. No Brasil suspendeu-se a respiração quando Erwin Nyc via a sua bola - que seria o 6x6 - bater com estrondo na barra.
O Brasil conseguiu a sua primeira grande vitória numa fase final de um Mundial e, em abono da verdade, o futebol brasileiro - a relação de amor de um povo pela sua seleção - mudava para sempre. O Brasil mostrava ao mundo que tinha chegado para o conquistar.