No auge da sua carreira, Kevin Keegan tinha uma aura de estela pop. Brilhava intensamente e era capa de tabloides, estava sempre na «boca do povo», nem sempre pelos melhores motivos.
Em 1977 espantou a Europa, ao abandonar ##Liverpool para jogar na Alemanha, ao serviço do Hamburger. Tricampeão inglês, campeão europeu, foi ganhar uma fortuna no HSV, o jogador mais bem pago da Alemanha, com um salário ao nível das grandes estrelas que jogavam em Madrid, ##Barcelona ou Milão.
Uma época nos juniores e três na equipa principal do clube que militava no quarto escalão, despertaram o interesse de clubes maiores. Um deles foi o Liverpool, que o descobriu por intermédio de Geoff Twentyman, o olheiro que o indicou a Bill Shankly.
Com apenas 20 anos trocava Scunthorpe por Anfield Road e assinava pelo Liverpool, num negócio que rendeu 35 mil libras ao seu antigo clube.
You'll Never Walk Alone: primeiros sucessos
A 14 de Agosto de 1971, Keegan estreou-se com a mítica camisola dos reds, num jogo com o Nottingham Forest, apontando um golo 12 minutos depois de estar em campo. As boas prestações de Keegan, fizeram com que rapidamente Shankly o fizesse alinhar no onze inicial na frente de ataque ao lado de John Toschak.
Em 1972 é chamado pela primeira vez à seleção de esperanças de Inglaterra e um ano depois estreia-se contra o País de Gales num jogo de qualificação para o mundial de 1974. O seu primeiro golo ao serviço da seleção dos três leões seria em 1974, precisamente contra o País de Gales.
Em ##Liverpool brilhava, ajudando o clube a conquistar a sua primeira Liga após um jejum de sete anos. Nessa mesma época, juntamente com os seus colegas, Keegan levantou a Taça UEFA.
O Leeds United roubou o título ao Liverpool na época seguinte, mas Keegan não ficaria de mãos a abanar, sendo fundamental na caminhada dos reds até à final da FA Cup, onde com dois golos, ajudou a bater o Newcastle por 3x0.
Máquina vencedora
Voltaria meses depois a Wembley para jogar a Charity Shield contra o Leeds, mas desta feita o jogo não correu de feição, com Keegan a ser expulso depois de se envolver num "desencontro" com Billy Bremner. O árbitro não hesitou e expulsou os dois que abandonaram o relvado revoltados com a decisão, despindo as camisolas em sinal de protesto.
Seria o Liverpool a recuperar esse prestígio que os ingleses pensavam perdido. Depois de anos de domínio dos clubes holandeses e alemães na Taça dos Campeões Europeus, o Liverpool veio alterar o panorama futebolístico europeu.
Vencedores da Taça UEFA e da Liga em 1976, os reds completaram um histórico treble com a vitória na Liga, Taça da Liga e Taça dos Campeões no ano seguinte. Pelo meio falhou a FA Cup, perdida para o Manchester United.
Mas quatro dias depois, em Roma, o Liverpool bateu os alemães do Borussia Mönchengladbach por 3x1, conquistando o troféu pela primeira vez na sua história.
Dias depois Kevin Keegan assinava pelos alemães do Hamburgo, deixando a mítica camisola vermelha 323 jogos e 100 golos depois. Um dia, recordando os anos passados em Anfield Road, lembrou que já jogara com lágrimas nos olhos, pois sempre que ouvia os adeptos cantar «You'll Never Walk Alone», não conseguia controlar a emoção.
Made in England, premiado em França
Na cidade banhada pelo Elba Keegan tornou-se uma lenda, uma estrela comparável às grandes estrelas pop como os Rolling Stones ou os Beatles. Chegado a Alemanha confessou um sonho, «ter um milhão de libras antes de fazer 30 anos».
Na época de estreia na Bundesliga a personalidade de Keegan chocou com a dos colegas, ao ponto destes boicotarem o seu estilo de jogo, recusando passar-lhe a bola. Seria só na segunda época que Kevin Keegan fez as pazes com o plantel, brilhando ao mais alto nível de camisola branca, conseguindo vencer o Ballon d'Or do France Football, graças aos seus 12 golos na liga alemã, não obstante o clube ter terminado na décima posição.
Na terceira época pode finalmente liderar os rothosen (1) ao título que já escapava ao Dinossauro (2) há 19 anos. Ainda mais impressionante, guiou o clube alemão à sua primeira final da Taça dos Campeões Europeus, perdida para Nottingham Forest. Eram os tempos dourados do Mighty Mouse, o rato atómico, que do alto dos seus 1,69 cm, parecia um anão entre os gigantes alemães. Fintando tudo e todos, marcando golos de antologia, Keegan voltou a vencer o Ballon d'Or.
Southampton e o fim da carreira
Nos Saints Keegan fez parte de uma equipa com jogadores como Alan Ball, Phil Boyer, Charlie George e Mick Channon. O Southampton apontou 76 golos na First Division e terminou em sexto, a sua melhor classificação de sempre, garantindo a presença na Taça UEFA da época seguinte, onde seriam eliminados pelo Sporting de Malcolm Allison.
Na época seguinte o Southampton começou em grande estilo liderando a prova em Janeiro, mas três derrotas seguidas desmotivaram a equipa que acabou por terminar em sétimo. Keegan apontou 26 dos 72 golos dos Saints, vencendo o prémio de jogador do ano da PFA (3), sendo ainda galardoado como oficial da OBE (4), pelos seus préstimos ao futebol.
Após duas épocas falhadas no assalto aos lugares de topo, Keegan abandonou Southampton, mudando-se para norte, Newcastle, histórico que então disputava a Division Two.
A contratação de uma estrela da seleção, duas vezes Ballon d'Or por um clube do segundo escalão provocou grande expectativa na região. Ao lado de Peter Beardsley e Chris Waddle, Keegan festejaria a promoção à First Division no final da época de 1983/84.
Cansado pôs um ponto final da carreira, anunciando que se retirava com a família para Espanha, recusando a carreira de treinador e fazendo uma ocasional presença televisiva, efetuando comentários desportivos.
Na memória ficara uma carreira fantástica, pontuada por grandes momentos, apenas com uma mancha no currículo, o Campeonato do Mundo, onde só jogara na edição de 1982 em Espanha, onde surgiu lesionado e não conseguiu ajudar a Inglaterra a passar da segunda fase. Para desilusão de milhares de adeptos, Keegan falhou um golo de baliza quase aberta no jogo contra a Espanha e a Inglaterra voltou para casa sem conhecer o sabor da derrota.
Com a chegada de Bobby Robson ao banco da seleção, Keegan deixou de ser opção e nunca mais voltou a vestir a camisola dos três leões.
Treinador
Seria preciso esperar oito anos para Kevin Keegan voltar ao futebol, aceitando o convite do Newcastle United para orientar os magpies. O clube voltara a cair no segundo escalão e sofria para se manter, estando muito próximo da descida à Division 3. Keegan conseguiu evitar a despromoção e orientou a equipa na recem formada Division One, nova denominação do segundo escalão depois da formação da Premier League.
Contratando Andy Cole ao Bristol City e Robert Lee ao Charlton Athletic, para se juntarem a Gavin Peacock e David Kelly, Keegan montou uma equipa que liderou a prova do começo ao fim, garantindo a promoção ao topo do futebol inglês.
Reforçando a equipa com o belga Phillipe Albert e o suíço Marc Hottiger, Keegan apostou forte para a época seguinte, mas a saída de Andy Cole para o Manchester United em janeiro abalou de tal maneira o espírito da equipa, que caiu para o sexto lugar falhando a qualificação para as competições europeias.
Os anos foram passando e a Newcastle chegaram nome sonantes como os de David Ginola, Les Ferdinand e Faustino Asprilla, mas os magpies apenas se puderam contentar com dois vice-campeonatos (1996 e 1997).
Acabou por abandonar o Tyneside para rumar a Londres, onde orientou o Fulham. Seguiu-se a seleção inglesa, onde apesar de ter vencido a Alemanha na fase de grupos, viu a Inglaterra ser eliminada da primeira fase do Euro 2000, por culpa das duas derrotas por 2x3, com Portugal na estreia e com a Roménia no último jogo.
Em Outubro de 2000 apresentava a demissão depois de uma derrota caseira com a Alemanha, no último jogo jogado no antigo estádio de Wembley.
Assinou então pelo Manchester City que guiou de regresso à Premier League, mas depois foi incapaz de conquistar qualquer troféu com o clube mancuniano. Abandonou Maine Road em 2005 e voltou a Newcastle três anos depois. Mas passando pouco tempo saiu em desacordo com a direção.
A partir de então dedica-se ao comentário desportivo em diversos canais que transmitem no Reino Unido com a ITV ou ESPN.
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(1) Calções vermelhos.
(2) Dinossauros era uma das alcunhas do clube, devido ao facto de ser um dos mais antigos clubes do país.
(3) Professional Football Association, Associação de Futebol Profissional.
(4) Order of the Brittish Empire, Ordem do Império Britânico.